JOÃO CABRAL
NO CONSULADO DO PORTO
Há-de haver um poema sobre desatenções
e diversas faltas
de amor, mas acreditem
sou alheio a
esse facto
À falta de outra palavra
direi que
nem sequer estou triste
porque
apenas vejo o que vejo
Ergue-se, é
certo, uma muralha e o nevoeiro
coroando as
torres de imaginação
e poderia ao menos registar a poeira ferrujenta
e
endurecida, súbitos vapores do lirismo
Desta vez de
nada tomei posse
estão
impecáveis os cadernos, as réguas
e os
carimbos, cuido só das cortinas, dedicada
cegueira à luz que se perde no granito
cegueira à luz que se perde no granito
Em pura
verdade, volto o olhar
às extensões
da Andaluzia, assaltam-me
recados
urgentes do Recife, e nem esqueço
a minha
ausência, dia após dia
a iluminar
uma casa do Rio de Janeiro
Tudo expliquei
com o justo exemplo
da faca, dispenso
os dois gumes
as armas
brancas em demasia
Quase nunca abro
a porta que fizeram
os artesãos
desta cidade, muito agradeço
tão boa
madeira, deixa-me à distância de
soluços,
catarros, gritaria solta do lugar
quando, de hora a hora, ofereço
o que tenho de melhor, um tal silêncio
e olhos que calhou estarem fechados
o que tenho de melhor, um tal silêncio
e olhos que calhou estarem fechados
jmts
Construção Ponte Luiz I | Emílio Biel | 1885
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