poesia . fotografia . & etc.


Talvez o mundo não seja pequeno / Nem seja a vida um fato consumado . Chico Buarque de Hollanda, com Gilberto Gil








sábado, 24 de março de 2012

as súbitas permanências



FILATELIA

Fica serena a vida e toda a luz imensa
pelas paredes de papel delido
na felicidade de uma estampa antiga
o tigre de Bengala e a flor dos Alpes

São belas as cores que o dia, deposto, vinga
sépia, carmins, azul ultramarino
um espectro do mundo brilhando denso
a transparente saturação do momento

Mas o vento que assalta sempre as folhas?
E os carimbos, as colas e as dedadas
que fazer das imagens repetidas?

E se, nua, percorres esta casa
por entre os aguaceiros mais intensos
acende-se um relâmpago dos tempos


J.M.T.S. in As Súbitas Permanências, Quasi Edições, 2001 (aqui)













sexta-feira, 9 de março de 2012

O aprendiz de FEITICEIRO
teorias portáteis sobre poesia



A Poesia ou O Fôlego do Nadador


Quando se propõem teorias sobre poesia (mesmo se portáteis) a expectativa será a de anunciar ou celebrar o que a poesia é.
Pedro Eiras no ensaio "O que é a poesia?", com que abre o seu volume A Lenta Volúpia de Cair (Quasi Edições, 2007 - aqui), explica-nos que se trata de uma questão mal colocada. Aliás, será mesmo pertinente (questiona-se de novo) formular a própria pergunta, tratando-se de um objecto como a poesia?
Pedro Eiras:
« Dizer que a poesia "é" implica vê-la enquanto um estado: "a poesia é" impede enunciados como, por exemplo, "a poesia dança" ou "a poesia queima". » (p.14)
« Se a prosa estende o novelo a uma velocidade alucinante, a poesia deixa as palavras em ilhas e pede que nademos de praia em praia. Os pulmões do nadador trabalham contra as ondas. || O poema mantém as palavras entre distâncias, não entre medidas. A única medida, a haver, é o fôlego do nadador. » (p.19)
É assim também no belíssimo vídeo em que Roberta Ferraz diz um poema de Fiama Hasse Pais Brandão ("Anjo de papel ou de água?"), incluído na série "Empreste sua voz a um poeta morto", em Modo de Usar & Co (aqui).

roberta ferraz diz fiama. filmado por marcelo f oliveira em Guecá / SP

O rosto do leitor fica oculto. Deixa que o papel e o mundo brilhem por ele, o mundo em espuma e cabelos confundidos com a ventania. A oscilação do mundo que acompanha o ritmo do poema, ou o contrário, como se o poema fosse a realidade do mar e o mar a metáfora do poema.

Ou, mergulhando no texto de Fiama:
Vai fascinar-me o torvelinho mor- / tal em que mesmo os poemas sem dor / sempre se desfazem.

outras teorias portáteis sobre poesia aqui